terça-feira, 25 de junho de 2013

Manifesto e Estatudo do Homem

Tá faltando poesia nas manifestações populares.

A violência arde os olhos.
A liberdade de expressão que aparece
Aperta os nós na garganta.
A mudez da paz conclama para a luta
Contra o método de cura,
Via remédio amargo
De cápsulas de bala perdida. 

E numa plena segunda-feira,
Entrou como raio de sol pela janela,
Uma coragem nunca antes na história,
E se abriram os olhos do gigante,
Belo adormecido,
Num berço esplêndido
Há meio milênio.

Vai então a sugestão ao Congresso Nacional para que aprove cada artigo abaixo! Se precisarem de um plebiscito para votarem nele, que o país faça um plebiscito! Tirado de um poeta que imortalizou o poema abaixo, e que já até vi o Artigo II pintado num muro...

 ESTATUTO DO HOMEM (Ato Institucional Permanente)

                                           A Carlos Heitor Cony



    Artigo I

   Fica decretado que agora vale a verdade.
   agora vale a vida,
   e de mãos dadas,
   marcharemos todos pela vida verdadeira.


   Artigo II
   Fica decretado que todos os dias da semana,
   inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
   têm direito a converter-se em manhãs de domingo.


   Artigo III

   Fica decretado que, a partir deste instante,
   haverá girassóis em todas as janelas,
   que os girassóis terão direito
   a abrir-se dentro da sombra;
   e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
   abertas para o verde onde cresce a esperança.


   Artigo IV

   Fica decretado que o homem
   não precisará nunca mais
   duvidar do homem.
   Que o homem confiará no homem
   como a palmeira confia no vento,
   como o vento confia no ar,
   como o ar confia no campo azul do céu.

           Parágrafo único:

           O homem, confiará no homem
           como um menino confia em outro menino.


   Artigo V

   Fica decretado que os homens
   estão livres do jugo da mentira.
   Nunca mais será preciso usar
   a couraça do silêncio
   nem a armadura de palavras.
   O homem se sentará à mesa
   com seu olhar limpo
   porque a verdade passará a ser servida
   antes da sobremesa.


   Artigo VI

   Fica estabelecida, durante dez séculos,
   a prática sonhada pelo profeta Isaías,
   e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
   e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.


   Artigo VII
   Por decreto irrevogável fica estabelecido
   o reinado permanente da justiça e da claridade,
   e a alegria será uma bandeira generosa
   para sempre desfraldada na alma do povo.


   Artigo VIII

   Fica decretado que a maior dor
   sempre foi e será sempre
   não poder dar-se amor a quem se ama
   e saber que é a água
   que dá à planta o milagre da flor.


   Artigo IX
   Fica permitido que o pão de cada dia
   tenha no homem o sinal de seu suor.
   Mas que sobretudo tenha
   sempre o quente sabor da ternura.


   Artigo X
   Fica permitido a qualquer pessoa,
   qualquer hora da vida,
   o uso do traje branco.


   Artigo XI

   Fica decretado, por definição,
   que o homem é um animal que ama
   e que por isso é belo,
   muito mais belo que a estrela da manhã.


   Artigo XII

   Decreta-se que nada será obrigado
   nem proibido,
   tudo será permitido,
   inclusive brincar com os rinocerontes
   e caminhar pelas tardes
   com uma imensa begônia na lapela.

           Parágrafo único:

           Só uma coisa fica proibida:
           amar sem amor.


   Artigo XIII

   Fica decretado que o dinheiro
   não poderá nunca mais comprar
   o sol das manhãs vindouras.
   Expulso do grande baú do medo,
   o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
   para defender o direito de cantar
   e a festa do dia que chegou.


   Artigo Final.

   Fica proibido o uso da palavra liberdade,
   a qual será suprimida dos dicionários
   e do pântano enganoso das bocas.
   A partir deste instante
   a liberdade será algo vivo e transparente
   como um fogo ou um rio,
   e a sua morada será sempre
   o coração do homem.
  Thiago de Mello
Santiago do Chile, abril de 1964

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