O PRIMEIRO POEMA
Água, brancura e luz da madrugada,
E nardos orvalhados, olhos tardos,
E regressos de longe, lentos, vagos,
De espiral que se expande, ou nebulosa.
Assim diria que o mundo se criou:
Gesto liso das mãos do universo
Com perfumes e auras que anunciam,
Noutras mãos de quimera, outro verso.
O FRUTO
Mordo, voraz, a polpa e sob a língua
Se derrama o sabor reconhecido
Do fruto que se deu e que não mente.
Tudo parece igual, mas, no limite,
Decifro como um deus a obra doutro:
A promessa escondida na semente.
É TÃO FUNDO O SILÊNCIO
É tão fundo o silêncio entre as estrelas.
Nem o som da palavra se propaga.
Nem o canto das aves milagrosas.
Mas lá, entre as estrelas, onde somos
Um astro recriado, é que se ouve
O íntimo rumor que abre as rosas.
Porque é dela onde brotam fungos, transforma-se húmus, sucumbem túmulos, surgem larvas que se multiplicam e irradiam cheiro, cor e o ciclo da vida faz-se em flor.
domingo, 30 de março de 2008
segunda-feira, 17 de março de 2008
Tacitelha
Calhou, brincalhona,
Da calha cair
Lá de cima
E cada retalho de telha
Entediar-se.
Brinca de ser brinquedo.
Desse pra ser sério,
Brinquedo não seria.
Leva ainda de brinde
Aquele brim engomado,
Brinco perolado.
Aí sai pelo lado,
Lá do quintal da casa,
Da quinta avenida,
Às quintas do condado.
Quantas não foram os alçares
A alcançarem a alça do mundo,
A lançarem-se lancinantes
Sobre lagos, lagoas,
Açudes lá de cima dos montes,
E observarem o recolorir
Calado das telhas
Tácitas...
Da calha cair
Lá de cima
E cada retalho de telha
Entediar-se.
Brinca de ser brinquedo.
Desse pra ser sério,
Brinquedo não seria.
Leva ainda de brinde
Aquele brim engomado,
Brinco perolado.
Aí sai pelo lado,
Lá do quintal da casa,
Da quinta avenida,
Às quintas do condado.
Quantas não foram os alçares
A alcançarem a alça do mundo,
A lançarem-se lancinantes
Sobre lagos, lagoas,
Açudes lá de cima dos montes,
E observarem o recolorir
Calado das telhas
Tácitas...
sexta-feira, 14 de março de 2008
Devotos de Moria II
E o desastrado vivia
Separando o corpo da mente,
Batendo a cabeça nas quinas da sã consciência,
Tropeçando nos próprios pés pelas portas da percepção,
Falando pelos cotovelos no divã da psiquiatria,
Dando nós na garganta diante da perplexidade do real,
Quebrando espelhos do próprio reflexo,
Respirando ofegante no zen-budismo das altas montanhas,
Engasgando-se ao ingerir o maná dos deuses,
Mais pensava ou mais agia?
Cada passo que seguia friamente calculado
Segundo testemunhas oculares bisbilhoteiras;
Conforme a faculdade débil mental;
Tal qual as regras geométricas amestradas;
Pesquisado por cientistas do pinel,
Era eletrochocado pela realidade
De inéditos clichês
E camisas-de-força a um
E noventa
E nove.
Noves fora zero à esquerda!
Porque tudo é tudo
E nada é nada
- assim filosofou Dom Maia.
O desastrado mente de vez em sempre,
Sai de casa sem grana e volta bêbado,
Não gasta dinheiro no cigarro a varejo,
Goza na cama depois do inesperado beijo.
É sem querer querendo ou quase sem querer,
É não pensar em dizer o que não se pensa
Ou em não dizer o pensar naquilo que não se diz?
Apenas versos desastrados.
Separando o corpo da mente,
Batendo a cabeça nas quinas da sã consciência,
Tropeçando nos próprios pés pelas portas da percepção,
Falando pelos cotovelos no divã da psiquiatria,
Dando nós na garganta diante da perplexidade do real,
Quebrando espelhos do próprio reflexo,
Respirando ofegante no zen-budismo das altas montanhas,
Engasgando-se ao ingerir o maná dos deuses,
Mais pensava ou mais agia?
Cada passo que seguia friamente calculado
Segundo testemunhas oculares bisbilhoteiras;
Conforme a faculdade débil mental;
Tal qual as regras geométricas amestradas;
Pesquisado por cientistas do pinel,
Era eletrochocado pela realidade
De inéditos clichês
E camisas-de-força a um
E noventa
E nove.
Noves fora zero à esquerda!
Porque tudo é tudo
E nada é nada
- assim filosofou Dom Maia.
O desastrado mente de vez em sempre,
Sai de casa sem grana e volta bêbado,
Não gasta dinheiro no cigarro a varejo,
Goza na cama depois do inesperado beijo.
É sem querer querendo ou quase sem querer,
É não pensar em dizer o que não se pensa
Ou em não dizer o pensar naquilo que não se diz?
Apenas versos desastrados.
Desamoralização
Tantas fábulas confabuladas
Conformadas em bulas
Burladas por burros de cargas.
Nas rédeas não arredam os pés
Descalços os sábios que marcam
A ferro e fogo as foices e martelos.
Misturam-se paródias e rapsódias
De cavaleiros andantes e res desgarradas
Numa descompassada mixórdia de passos
Passados, presentes e futuros.
E acabam submetidos em confusão
Porque transgridem a subversão.
O moralista ainda tenta
Desmoralizar a multidão,
Mas, na moral,
Assim o amoral moraliza-se,
Enjoa da rebeldia
Que de tão sem causa acaba
Perdendo as calças.
E não é só o rei que fica nu,
Toda plebe acaba mostrando as vergonhas
E quem fica vestido envergonha-se.
Verso o reverso pelo avesso do avesso
Já que diversas são agora as artes que enalteço.
Antes que me esqueça
Todos os personagens de seus monólogos
São ventrílocos sem platéia
Logo, de que vale a encenação?
Vale o quanto a consciência pesa.
Aí o José, irmão do João do Pé de Feijão,
Subiu lá no castelo do gigante
E achou pêlo loiro
No ovo da galinha dos ovos de oiro.
Conformadas em bulas
Burladas por burros de cargas.
Nas rédeas não arredam os pés
Descalços os sábios que marcam
A ferro e fogo as foices e martelos.
Misturam-se paródias e rapsódias
De cavaleiros andantes e res desgarradas
Numa descompassada mixórdia de passos
Passados, presentes e futuros.
E acabam submetidos em confusão
Porque transgridem a subversão.
O moralista ainda tenta
Desmoralizar a multidão,
Mas, na moral,
Assim o amoral moraliza-se,
Enjoa da rebeldia
Que de tão sem causa acaba
Perdendo as calças.
E não é só o rei que fica nu,
Toda plebe acaba mostrando as vergonhas
E quem fica vestido envergonha-se.
Verso o reverso pelo avesso do avesso
Já que diversas são agora as artes que enalteço.
Antes que me esqueça
Todos os personagens de seus monólogos
São ventrílocos sem platéia
Logo, de que vale a encenação?
Vale o quanto a consciência pesa.
Aí o José, irmão do João do Pé de Feijão,
Subiu lá no castelo do gigante
E achou pêlo loiro
No ovo da galinha dos ovos de oiro.
quinta-feira, 13 de março de 2008
Devotos de Moria
"Ora, o que é a vida? É uma espécie de comédia contínua em que os homens, disfarçados de mil maneiras diferentes, aparecem em cena, desempenham seus papéis, até que o diretor, depois de tê-los feito mudar de disfarce e aparecer ora sob a púrpura soberba dos reis, ora sob os andrajos repulsivos da escravidão e da miséria, força-os finalmente a sair do palco. Em verdade, este mundo não é senão uma sombra passageira, mas assim é a comédia que nele representamos todos os dias."
Como os costumes morais da sociedade em que vivemos, e nos direciona a grande comédia da vida à mais entediosa rotina.
"É tão imprudente a prudência perniciosa quanto é insano ter uma sabedoria deslocada. Ora, não há prudência mais perniciosa que a que não sabe adaptar-se aos tempos e às circunstâncias, e que gostaria que a comédia não fosse uma comédia. Bebam, ou vão embora! dizia outrora os gregos a seus convivas; e eles tinham razão. A verdadeira prudência consiste, já que somos humanos, em não querer ser mais sábios do que nossa natureza o permite. É preciso ou suportar com boa vontade as loucuras da multidão, ou deixar-se levar com ela pela torrente dos erros.
"Mas, direis, é loucura conduzir-se assim"
"Concordo, contanto que concordeis também que isso é realmente o que se chama representar a comédia da vida."
Como os costumes morais da sociedade em que vivemos, e nos direciona a grande comédia da vida à mais entediosa rotina.
"É tão imprudente a prudência perniciosa quanto é insano ter uma sabedoria deslocada. Ora, não há prudência mais perniciosa que a que não sabe adaptar-se aos tempos e às circunstâncias, e que gostaria que a comédia não fosse uma comédia. Bebam, ou vão embora! dizia outrora os gregos a seus convivas; e eles tinham razão. A verdadeira prudência consiste, já que somos humanos, em não querer ser mais sábios do que nossa natureza o permite. É preciso ou suportar com boa vontade as loucuras da multidão, ou deixar-se levar com ela pela torrente dos erros.
"Mas, direis, é loucura conduzir-se assim"
"Concordo, contanto que concordeis também que isso é realmente o que se chama representar a comédia da vida."
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